No dia 17 deste mês, lembramos e celebramos o dia em que Francisco foi marcado com as chagas do Crucificado. Tanto ele, como Clara, ainda que “fugindo” do mundo (segundo a linguagem do tempo), se deixaram marcar profundamente pelas dores da humanidade.
Em seu coração doem as chagas do coração da terra que, já em seu tempo, não pertencia a quem nela trabalhava, em condições desumanas; coração, em nosso tempo, impiedosamente rasgado pela mineração, sangrante de sangue derramado pelo latifúndio; coração ferido pelas condições de total insalubridade em que trabalham tantos operários e operárias. Fere seu amor a chaga da fome que dói no estômago e no coração, a doença e a morte que espreitam em cada esquina, todas as formas de abuso contra crianças e anciãos, contra a mulher e contra o pobre, contra quem carrega qualquer diferença.
Em suas mãos doem as chagas das trêmulas mãos anciãs ou pequeninas mãos infantis que suplicam alguma migalha; dói a chaga da mão que quer trabalhar e não encontra onde, da mão que se quer estender mas está amarrada pela injustiça e corrupção.
Em seus pés sangram as chagas dos pés gretados de quem trabalha a terra e não pode se alimentar dela; doem os calos dos pés migrantes em busca de melhores condições de vida; dói a chaga do cansaço das infindáveis idas e vindas, muitas vezes infrutíferas aos centros de documentação... Chagas de Francisco, chagas dos crucificados que doem no dilacerado corpo do Crucificado.
O conhecido relato da impressão das chagas está em 1Cel 94 e 95. Mas, aqui, trazemos um texto menos conhecido: o testemunho de frei Elias, Ministro da Ordem quando Francisco morreu: “E agora dou notícia de uma grande coisa, de um milagre verdadeiramente novo. De facto, nunca se soube que um semelhante sinal se tenha verificado se não em Cristo Filho de Deus. Não muito tempo antes da morte Francisco apareceu crucificado, trazendo no seu corpo as cinco chagas com os verdadeiros estigmas de Cristo… Suas mãos e pés tinham como que as perfurações, transpassadas de ambas as partes, conservando as cicatrizes e deixando ver o negrume dos cravos. Seu lado apareceu traspassado por uma lança e muitas vezes fazia jorrar sangue” (Carta de Frei Elias 15-19).
Clara carregou em seu corpo a chaga de prolongada enfermidade, mas carregou sobretudo, no coração as chagas do Crucificado, as chagas de quem se aproximava dela, em busca de alento para suas dores, seja do corpo, como do coração ou do espírito atribulado.
“Compadecia-se das tristes, sofrendo com elas e, chorando, curava as lágrimas das sofredoras. Muitas vezes prostrava-se aos pés das mais aflitas e tentava aliviar a sua dor com carinhos maternais...” (LSC 29). “Aproximava-se a hora de colher o prêmio do chamamento divino. Mas antes experimentou múltiplos sofrimentos. O vigor do corpo não resistiu à austeridade das penitências dos primeiros anos e foi vencido nos últimos tempos por grave doença.” (LSC 39).
Que também nós, que temos como projeto “viver o Evangelho inspiradas/os em Francisco e Clara de Assis”, nos deixemos marcar pelas feridas da criação inteira, saibamos nos inclinar para aliviar suas dores e acolher seus gemidos, empenhando-nos assim, para transformar a terra seca num jardim em flor.
Comentários
São Francisco rogai por n´s.
Muchas gracias pelos textos e a dinâmica iluminadora que o Francisclareand o nos anuncia, fiel e presente em nossos caminhos!
Agora, com o tema "Chagas de Cristo e Chagas da Humanidade" somos convidadas a nos 'inclinar para aliviar as dores e acolher os gemidos, da criação inteira... '
É este grito pela VIDA, que nos meses de agosto e setembro, em Brasília, os povos indígenas, numa esplendorosa manifestação de espiritualidade s, saberes e cores, mobilizam-se para a defesa da Mãe Terra e de seus filhos e filhas! Rostos de mulheres, jovens, mães e avós de mais de 185 povos, expressam, através de palavras, gestos e ritos, as angústias e esperanças do Brasil indígena!
Gratidão, Maria Fachini!