A única guerra legítima é aquela que se declara contra a miséria e a ignorância.
Dom Helder Câmara
A luta pela vida e pelos territórios sagrados faz parte do dia a dia do povo Indígena Guarani Kaiowá no Mato Grosso do Sul. Constantemente sofrem ataques em suas comunidades, ameaçando sua espiritualidade, cultura e destruindo o bem viver.
Ao som do maracá e com a força do nascer do sol em vários tekohás do Povo Guarani Kaiowá, no dia 25 de fevereiro, as Irmãs Andréa Moratelli e Maria Adinete Azevêdo da Congregação das Irmãs Catequistas Franciscanas, e a Irmã Maria Câmara Vieira da Congregação das Servas da Santíssima Trindade – missionárias e parceiras do Conselho Indigenista Missionário – CIMI, viajaram de Dourados, MS com destino a São Paulo, capital, em um micro-ônibus, acompanhando 16 pessoas das comunidades indígenas Guarani Kaiowá, incluindo Passo Piraju, Guyraroká e Nhu Vera Guasu.
Com alegria e espírito missionário, o objetivo era marcar presença como família no julgamento do Júri de Ação Penal dos réus Walmir Junior Savalo e Sandra Arevalos Savalo, conduzido pela Justiça Federal de São Paulo com a participação popular de sete jurados. Este julgamento estava relacionado a um processo de conflito territorial ocorrido em 2006, envolvendo a reivindicação da demarcação de seu território tradicional, sendo os réus acusados da morte de dois policiais e da tentativa de um terceiro.
A comunidade indígena, profetizando e contando com a força de seus ancestrais, denunciou o ocorrido em 01 de abril de 2006 na comunidade Passo Piraju, enfrentando grande sofrimento. Relatos dos Guarani Kaiowá indicam que policiais à paisana, em uma Parati preta descaracterizada, invadiram a aldeia, efetuando vários disparos de arma de fogo, resultando em um indígena atingido no dedão do pé. Vestidos com shorts e camisetas, fortemente armados, foram confundidos com jagunços de fazendeiros. Alguns indígenas da comunidade abordaram o veículo em busca de explicações, momento em que a arma calibre 12, que pertencia ao policial à paisana Emerson Gadani, disparou, atingindo uma das vítimas fatais.
De 26 a 28 de fevereiro, toda a delegação participou presencialmente do Júri relacionado ao processo penal, oferecendo seu apoio e a força dos encantados para os réus. Após três dias de julgamento, por volta das 23 horas do dia 28 de fevereiro, todos os participantes, direta e indiretamente envolvidos, celebraram com vibração e emoção o resultado: Walmir e Sandra foram inocentados das acusações de duplo homicídio ocorrido há 18 anos em um júri popular. Foram momentos de aprofundamento na história do caso e de tensão e revolta ao ouvir depoimentos injustos por parte da acusação, onde os pequenos são sempre oprimidos, mas a justiça venceu o opressor.
Como diz o Cântico do Magnificat: “derruba do trono os poderosos e eleva os humildes” (Lc 1, 52). Com louvor e gratidão, voltamos nossos olhos cheios de admiração, gratidão, emoção e aprendizado mediante o trabalho realizado pela Juíza Federal, Bárbara de Lima Iseppie, toda a equipe de defesa dos indígenas acusados com a assessoria jurídica do Conselho Indigenista Missionário – CIMI, Dra. Caroline Hilgert, Dra. Michael Nolan e Dr. Guilherme Madi, e pelo procurador da Advocacia Geral da União (AGU) com atuação na Fundação Nacional dos Povos Indígenas (FUNAI).
Desta forma, de 25 a 28 de fevereiro, a delegação do CIMI - MS pernoitou e foi carinhosamente acolhida pela Comunidade das Irmãs Servas da Santíssima Trindade, que abriram as portas de casa para acolher com alegria, sensibilidade, amor e ternura ao grupo, sempre com um sorriso no rosto e grande serenidade. Foram momentos de amor, acolhida e leveza. Nossa gratidão e respeito por tanto amor e dedicação.
Vivenciamos um momento em que várias etnias indígenas estão sendo atacadas, sofrendo por diversos motivos. São ameaças de vários lados: por terra, milícias de grandes latifundiários; por água, garimpeiros e dragas; e por ar, até com veneno são pulverizadas as comunidades indígenas no Mato Grosso do Sul. Além disso, há Projetos de Lei inconstitucionais e na estagnação nos processos de demarcação de terras, mas a justiça de Deus nunca falha. Ele age no tempo certo e faz acontecer as coisas como deveriam.
A luta e a resistência dos povos originários em defesa de suas terras e do direito à vida, à saúde, à educação, à cultura, à preservação e ao respeito de suas tradições não morrerão; elas continuarão.
Crédito da Foto: CIMI - Conselho Indigenista Missionário