Estamos às portas da celebração máxima da comunidade cristã. A festa da vitória da vida sobre a morte. Uma linda música do Manelão nos expressa a força da ressurreição na luta do povo: “Dentro da noite escura da terra dura do povo meu, nasce uma luz radiante no peito errante: Já amanheceu”.
Nosso mundo vem vivendo noites muito escuras. Presenciamos acontecimentos que estão há anos luz de alguma explicação, convivemos com líderes políticos que são verdadeira ameaça à sobrevivência da humanidade... muita incerteza, inúmeras perguntas sem resposta, muito clamor, muita lágrima, morte sobre morte. Mas nos preparamos para celebrar a vitória da verdade sobre a mentira, da razão sobre a loucura, da justiça e direito sobre a injustiça, da liberdade sobre a opressão, da vida sobre a morte. Como cantamos jubilosamente: “Passou a escuridão, o Sol nasceu. A vida triunfou, Jesus ressuscitou”.
É fato conhecido por todos que a Cruz foi a presença mais marcante na vida de Francisco a partir de sua conversão. O Crucificado foi o motor de sua conversão, segundo o testemunho das Fontes: “Poucos dias depois, passando perto da igreja de São Damião, foi-lhe dito em espírito que entrasse nela para rezar. Entrando, começou a orar fervorosamente diante da imagem de um Crucifixo, o qual piedosa e bondosamente lhe falou: “Francisco, não vês que a minha casa se destrói? Vai, pois, e restaura-a para mim”.
Trêmulo e atônito, disse: “De boa vontade o farei, Senhor”. Entendeu que se falava daquela igreja que, por ser muito antiga, ameaçava cair proximamente. Com essas palavras ficou repleto de tanto contentamento e tão iluminado, que sentiu verdadeiramente em sua alma que fora o Cristo crucificado que falara com ele” (LTC 13,6-10).
Sua união ao Crucificado fez sua vida brilhar como sol no mundo. Ele continua, oito séculos depois sendo luz no caminho de muitas pessoas, de povos e nações. A ressurreição acontece cada homem ou mulher que segue seu exemplo de cuidado amoroso com a vida, com as criaturas todas, com seu convite ao louvor, com seu apelo de retorno ao evangelho. Acontece conosco quando nosso testemunho faz brilhar a irmandade, o cuidado mútuo, a defesa e proteção da vida.
Clara passou sua vida imersa na contemplação do Pobre crucificado que se traduzia, na prática, em serviço devoto e amoroso às irmãs e a todos que para ela representavam a pobreza e o sofrimento de Cristo na cruz. Pelo sinal da cruz fazia brilhar a vida onde ela estava apagada. Entre outros testemunhos temos estes da Bula de canonização:
“...Devolveu a voz a uma das irmãs do mosteiro que havia muito a tinha perdido; o mesmo fez com uma irmã que sofria duma paralisia na língua; a uma outra curou da surdez. Com o sinal da cruz traçado sobre elas, libertou uma de febres, outra de hidropisia, uma de fístulas e de outras enfermidades. Até curou um frade da loucura” (BC 54b-58).
“A testemunha deu depois informações sobre o que aconteceu com um menino que tinha uma vista quase coberta por uma mancha. Foi levado a Santa Clara que o tocou e fez sobre ele o sinal da cruz. Depois mandou que o levassem à Irmã Hortolana, mãe de Clara, que também vivia no Mosteiro de São Damião, para que ela também traçasse sobre o menino o sinal da cruz. Depois disto o menino ficou curado” (PC 4,11a).
Da mesma forma que Jesus abraçou a cruz como caminho para conquistar-nos a vida, o sinal da cruz que traçava Clara sobre as pessoas e até sobre outras coisas como o pão e o azeite (cf. PC 1,15; 6,16), era portador de mais vida, de saúde e ação de graças. Vitória, tu reinarás, ó cruz, tu nos salvarás! Nos ressuscitarás! Tu nos introduzes na vida
Que Francisco e Clara nos ajudem a fazer de nossas cruzes cotidianas caminho de ressurreição, para nós e para toda a criação que espera ansiosamente pela ação libertadora dos filhos e filhas de Deus. Que terminando o caminho quaresmal, possamos celebrar com luz e calor a festa da Páscoa e fortalecer-nos para testemunhar ao mundo que a última palavra é da vida. Que possamos proclamar que, abraçando o Cristo pobre e crucificado, celebramos a vida que sempre prevalece, apesar de tudo o que acontece.
Uma Páscoa cheia de vida e alegria, de risos e abraços, de aleluias que brotam do mais profundo de nosso ser iluminado pelo fulgor do Ressuscitado. Feliz Páscoa.
