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26 Outubro 2017
Rede um Grito pela Vida, sinal profético numa sociedade que não respeita a vida de ninguém

O compromisso com o Reino, que nos leva a lutar por um mundo melhor para todos e todas, deve ser uma prioridade que surge do batismo. Respondendo a essa responsabilidade e movida por esse desejo, a vida religiosa no Brasil criou, há 10 anos, a Rede um Grito pela Vida, no intuito de enfrentar e combater o Tráfico Humano.

Em Brasília, de 19 a 22 de outubro, se reuniram 70 religiosas, religiosos e leigas para celebrar a primeira década de existência da Rede, avaliando a trajetória percorrida até agora e projetando o caminho a seguir no futuro, elegendo a nova equipe de articulação nacional e das diferentes regiões.

A situação que o mundo e o país vivem, na qual o domínio do sistema neoliberal tem nos levado a uma situação em que não se respeita a vida de ninguém, com perda de direitos e das políticas de inclusão social, tem como consequência o aumento do Tráfico Humano em todas as suas dimensões.

Neste contexto, a Rede, organizada “a partir da fé em Deus e do amor à vida”, em palavras de Frei Carlos Mesters, atualmente conta com mais de 200 religiosas e religiosos e 75 leigas e leigos, que fazem parte de uma centena de Congregações espalhadas em quase todos os estados do país, e tem crescido  consideravelmente, mesmo com a falta de recursos e recordando que no começo eram apenas 28 pessoas. Aos poucos, a Rede foi ganhando em visibilidade e incidência sociopolítica, fruto de um processo de formação cada vez maior, mesmo que ainda falte o reconhecimento explícito em muitos ambientes eclesiais.

Nessa perspectiva da presença nas periferias, Bárbara Furgal, Franciscana Missionária de Maria, que trabalha na prelazia de Tefé (Amazonas), que fazia parte da coordenação de articulação nacional da Rede, reconhece que na vida religiosa ainda “falta uma abertura maior para poder ouvir os gritos que vêm da realidade, pois muitas vezes ficamos centradas nas obras e trabalhos que fizemos até agora, em diversas situações que, sem dúvida, no dia a dia, nos tiram a atenção do foco, que deveria ser tentar ouvir os gritos que vêm da sociedade em que a gente vive e do local em que atuamos”. 

A irmã Bárbara não duvida em afirmar que devemos ser conscientes e ressalta: “sempre temos mil e uma ideias para resolver as situações, mas acredito que é preciso estar perto do povo, caminhar juntos, ouvir o povo, pois tudo começa por aí, acompanhar vários momentos que fazem parte da vida do povo com quem trabalhamos, nos aproximarmos”.

Na linha do Papa Francisco, nunca podemos deixar de lado a “necessidade de estar atentos aos sofrimentos dos seres humanos”, segundo Dom Enemésio Lazzaris, Presidente da Comissão Especial para o Enfrentamento ao Tráfico Humano, da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB). Na Eucaristia de Ação de Graças pelos 10 anos, ele ressaltou que é preciso continuar seguindo o exemplo de “Jesus Cristo que se colocou do lado dos pequenos, fragilizados e pecadores”, sendo conscientes que “hoje, em nossa sociedade, existem muitos grupos em risco de cair na vulnerabilidade social”, destacando o papel da Rede como “um grupo de pessoas, sobretudo religiosas, atentas aos gritos de tantas pessoas, principalmente das vítimas de um grande mal, como é o Tráfico Humano”.

Um dos objetivos da Rede é ajudar a sociedade a tomar consciência da problemática do tráfico de pessoas. Nesse ponto, Denise Morra, Missionária do Sagrado Coração de Jesus, Cabrini, que realiza seu serviço pastoral em Teresina, falando sobre a incidência da Rede um Grito pela Vida na sociedade brasileira, reconhece sua importância “na defesa da vida através das diferentes colaborações que vai estabelecendo, particularmente no combate do Tráfico de Pessoas, se tornando reconhecida pelos agentes sociais, pelos movimentos políticos e pelas políticas públicas, aspecto em que temos crescido muito”.

A irmã Denise reconhece que a Rede “ainda não tem conseguido contagiar esse sentimento à sociedade brasileira; conseguimos ser visibilizados, mas é preciso fazer um trabalho muito mais pontual de conseguir ganhar espaços públicos, comunitários e também convencimento nos próprios territórios onde estamos”. 

Por isso, vê necessário a “formação nas escolas, associações, paróquias e nos abrirmos diante das forças que se têm nos CRAS e CREAS, e principalmente, sair de dentro da Igreja com uma linha mais ecumênica”.

Frei Luiz Carlos Batista, agostiniano, Articulador do Núcleo da Região Sul, formador de sua Ordem em Curitiba, diz que o trabalho na Rede “é uma forma de sair da minha zona de conforto para as periferias existenciais, uma atuação profética, pois como religiosos temos uma vida muito segura, comparada com a maioria das pessoas, em seu dia a dia na sociedade. Nós temos nossos planos de saúde, carro para nos locomover, estudo, viagens, conhecemos línguas e países. Muitas vezes, a maioria do povo não tem e, entre eles, está uma enorme quantidade de pessoas que, na busca de um trabalho, de uma oportunidade na vida, acaba caindo nas redes do tráfico de pessoas, onde os sonhos de jovens e crianças podem se tornar uma armadilha”.

Na Rede falta maior participação da vida religiosa masculina. Diante dessa realidade, o frei reconhece que “a vida religiosa masculina está muitas vezes clericalizada”, o que faz com que “o trabalho nas paróquias, colégios e outras frentes, que nos exige muito a partir de nosso sacerdócio. Muitos consideram que esse pastoreio de almas já é uma forma de trabalho social”.

Também afirma que outra dificuldade é que “muitos religiosos não participam dos grupos da Conferência dos Religiosos do Brasil”, junto com o fato de que “o masculino nem sempre tem um olhar materno para algumas questões da vida, principalmente das dores e do sofrimento, o que é uma questão antropológica”.

Nesse desejo de projetar o futuro, a Rede tem assumido uma série de enfoques principais: incidência política e mobilização, comunicação, visibilização, formação, prevenção, com um foco nas mulheres e motivação da criação de novos núcleos onde não exista a ação de "fortalecer os frágeis".

Para tornar realidade esses enfoques, à Rede um Grito pela Vida foram propostas uma série de atividades em âmbito nacional, tais como: um instrumental com relatório de impacto social, curso de escuta qualificada, assumir a participação no Fórum Social Mundial com oficinas, manter a formação anual para lideranças, aproveitar a Campanha da Fraternidade sobre a violência, com foco na mulher e o IX Encontro Nacional da Rede em 2019.

De fato, ninguém pode esquecer as palavras com que o Papa Francisco nos chama a nunca desistir na luta para fazer realidade o Reino de Deus, pois sempre vai ser mais próxima ao Espírito de Jesus de Nazaré, “uma Igreja acidentada, ferida e enlameada por ter saído pelas estradas, do que uma Igreja enferma pelo fechamento e a comodidade de se agarrar às próprias seguranças”.

Informações adicionais

  • Fonte da Notícia: Pe. Luis Miguel Modino
  • Enviado por: Irmã Isabel do Rocio Kuss

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