"Conheço meus projetos sobre vocês, oráculo de Javé, para dar-lhes um futuro e uma esperança” (Jer 29,11)
Num clima de comunhão e esperança, nos dias 06 a 10 de maio, em Roma-Itália, aconteceu a XXI Assembleia da União Internacional das Superioras Gerais (UISG), com o tema: “Semeadoras de Esperança Profética”. Éramos um grupo de 850 irmãs “superioras gerais”, de 80 nacionalidades e 13 idiomas.
Nestes dias de assembleia, vivemos uma intensa comunhão com toda a vida consagrada e com a realidade dos pobres, onde as religiosas dos diversos carismas espalham sementes de esperança profética. Foram dias marcados pela convivência intercultural, oração e reflexão. Contemplamos a presença misericordiosa de Deus, na vida das irmãs presentes em situações de fronteira em todo o mundo, como cuidadoras da vida.
As reflexões sobre o tema, permeadas de testemunhos, questionaram nossa vivência missionária, revigoraram a coragem profética e nos desafiaram a restaurar a esperança. Ser semeadoras de esperança profética, como mulheres consagradas, neste mundo marcado por tanta injustiça, violência, morte e sofrimento, é um grande desafio que pede de nós compromisso com a profecia da compaixão.
Como nos disse irmã Teresa Maya, ao refletir sobre “Uma visão para o futuro da Vida Religiosa”, “a esperança é um presente dado com delicadeza, simplesmente, no meio da desesperança. Um presente que devemos notar, receber e tornar real, umas para as outras, na partilha. Nosso dom da esperança superará o medo. Devemos contar histórias da profecia da compaixão simples, silenciosas e gentis, que restauram vida no cotidiano de nossa missão, uma de cada vez, e que revelam a surpreendente verdade do que Deus já está fazendo entre nós!” Em Jeremias 29,11-13, “Deus promete um ‘futuro com esperança’ se buscarmos de todo o coração”. E ela conclui: “a profecia da compaixão nos trará esperança, desde que tenhamos uma VISÃO, fomentemos nossa MEMÓRIA, cultivemos nossa OBSERVAÇÃO e ousemos LIDERAR”.
Outra reflexão provocadora foi feita pela irmã Judette Gallares, religiosa do Cenáculo das Filipinas: “Semeadoras de Esperança Profética para o Planeta”. Com ela, refletimos sobre o que está acontecendo com o nosso planeta hoje, ouvimos os gemidos da terra, de toda a Criação, e aprofundamos a responsabilidade da Vida Religiosa numa perspectiva bíblica.
Segundo irmã Judette, a esperança profética se distingue da esperança com a qual as pessoas estão mais familiarizadas, que é uma experiência mais passiva de esperar, desejar ou mesmo otimismo. A esperança profética está enraizada na contemplação e na solidariedade com os sofrimentos de quem vive nas margens deste universo, que está sendo devastado pela ganância humana.
E continua: “A esperança profética é uma esperança crítica. Ela critica as estruturas internas e externas da dominação humana, que destroem a beleza original e o significado da criação de Deus. Baseia-se na disciplina do pensamento crítico, que leva a uma resposta de ação discernida e orientada, contra o desespero e o negativismo. [...]. Há uma necessidade urgente de que os cristãos em geral e os religiosos, em particular, ultrapassem o espaço de esperança acrítica para a esperança crítica, onde a pessoa entra em ação a partir do lugar de discernimento”. Gostei quando irmã Judette disse que a esperança crítica envolve abandonar as antigas estruturas e os velhos modos de pensar. A esperança crítica “subverte crenças antigas, desmantela estruturas sociais confiáveis e expõe ilusões e trivialidades”. A esperança envolve o mundo inteiro e toda a criação, e desta criação nós somos convocadas a ser cuidadoras.
Irmã Sheila Kinsey, fcjm, apresentou a campanha “Semeando Esperança para o Planeta”, lançada pela UISG em junho de 2018, compartilhando o empenho das religiosas em colocar em prática a Laudato Sí, e enfatizando a ligação que existe entre a crise ambiental e a crise social que estamos experimentando. A campanha é desenvolvida em parceria com a secretaria de Justiça, Paz e Integridade da Criação e com o Movimento Global Católico pelo Clima. Há um site especial para essa campanha, a fim de ajudar a coordenar e compartilhar as muitas atividades que as religiosas estão realizando. Nele encontramos muitas informações, também os vídeos de algumas videoconferências realizadas. Vale a pena ver! Endereço pra acesso: https://www.sowinghopefortheplanet.org/
Destaco aqui a webinar4 (videoconferência4): “Solidariedade: interconexão de preocupações globais e locais”, em que nossa irmã Laura Vicuña participou, compartilhando a reflexão sobre a espiritualidade indígena e o Sínodo Pan-Amazônico. A UISG renovou o convite para todas as congregações abraçarem esta campanha, manifestando nosso compromisso com uma conversão pessoal e comunitária, e caminhando juntas, de forma harmônica, escutando o gemido da terra e o clamor dos pobres, sendo instrumentos de esperança no coração do mundo.
A palestra “Vivência intercultural como sinal de esperança profética”, proferida pela irmã Adriana Carla Milmanda, SSpS, foi muito profunda, provocadora e esperançosa. A interculturalidade é um sinal de esperança profética para a humanidade quando a nossa própria experiência de convívio valoriza e dá lugar mutuamente transformador à “diferença” portas a dentro, pondo-nos a caminho para sair ao encontro do diferente, do marginalizado e explorado de hoje. As relações interculturais em nossas irmandades são sementes de esperança quando assumimos a vivência numa perspectiva pascal, que permite emergir o carisma nos diferentes povos e culturas. E um caminho para essa vivência é o diálogo, a conversão e a abertura das fronteiras, para que não haja “estrangeiras”, mas irmãs.
Vivemos num contexto de desesperança, num tempo de crise. Bem sabemos que é em tempos de crise que surgem os profetas e profetisas. Por isso, neste contexto de mobilidade humana, tráfico de pessoas e devastação da natureza, somos interpeladas a pequenos gestos de acolhimento, compaixão e ternura, que expressam a esperança, mas também somos convocadas a levantar a voz em defesa da vida.
Na assembleia, tivemos a participação especial do Cardeal Dom João Braz de Aviz, prefeito da Congregação para os Institutos de Vida Consagrada e as Sociedades de Vida Apostólica, com um diálogo bem esperançoso e animador sobre a missão da vida consagrada hoje.
Finalizamos a assembleia com uma audiência com o Papa Francisco, na Basílica de São Pedro. Antes da audiência, foi feito o lançamento da campanha pelo 10º aniversário de fundação de Talitha Kum, rede mundial de pessoas consagradas contra o tráfico de pessoas, iniciativa que nasceu de um compromisso assumido na Assembleia da UISG em 2003. Na Sala Paulo VI, o papa inaugurou a mostra fotográfica de Lisa Kristine, que documenta o trabalho de Talitha Kum pelo mundo.
O encontro com o papa foi marcado por muita emoção, alegria e esperança. No início, ele surpreendeu a todas com alguns gestos de simplicidade; em seguida, entregou para irmã Carmen Sammut, msola, presidente da UISG, o discurso que havia preparado (podem conferir no anexo), preferindo falar espontaneamente com as irmãs, como irmão Francisco. E assim, de forma muito simples e fraterna, foi tecendo o diálogo sobre alguns temas, iniciando pelo diaconato feminino. O papa entregou à presidente da UISG um documento com o resultado do trabalho feito pela comissão que ele criou, a pedido da UISG, para estudar o assunto. A comissão não chegou a uma conclusão e o resultado não é dos melhores. Sobre o trabalho das mulheres na Igreja, o Papa disse que erra quem pensa que se trata somente de um trabalho funcional. “A Igreja é feminina, é mulher. Não é uma imagem, é a realidade, é a esposa de Jesus, devemos ir avante com a teologia da mulher”.
E sobre a exploração e o abuso, o Papa insistentemente afirmou: “serviço, sim, servidão, não”! Ele disse: “Você não se torna religiosa para ser doméstica de um clérigo. Não!” E pediu às superioras um esforço mútuo para pôr fim a essa cultura da exploração e abuso. E acrescentou: “se uma irmã quer ser uma empregada, faça isso com os doentes e, nesse caso, é um serviço”. O Papa Francisco concluiu a sua fala dizendo que, se estiver vivo, participará da próxima assembleia da UISG, para ouvir de perto a voz das consagradas. Essa notícia nos trouxe muita alegria.
Sou profundamente grata a Deus pela participação nessa assembleia, pela vivência intercultural e pelo alimento da esperança profética em nossa vida-missão. Minha gratidão à irmã Ana Belen, superiora geral das Irmãs Dominicanas da Anunciata, com a irmandade de Roma, que me acolheram com carinho e generosidade em sua casa. Obrigada à irmandade da sede geral e a cada uma de nossas irmãs, pela comunhão e orações.
Que sejamos todas semeadoras de esperança profética, vivendo a interculturalidade nos diversos lugares onde estamos inseridas e exercemos nossa missão.
Comentários
Fraterno abraço.
Eliza