O tempo é propício. Tudo respira magicamente agradecimento, reconciliação, recomeço, retomada, bons propósitos que animam a prosseguir ainda que atravessando trecho sombrio do caminho. Apesar da profusão de brilho, de luz e de cores a noite continua noite e tem seus propósitos e seus mistérios. Ela proporciona o silêncio necessário para o mergulho interior, para o encontro com a Fonte de toda luz.
Francisco, tendo consciência de que a luz do dia se gesta no ventre da noite, sabe agradecer. O Espelho da Perfeição, nos apresenta o rico testemunho do qual trazemos aqui o resumo: “Quando jazia doente no palácio do bispo de Assis e parecia que a mão do Senhor estava mais pesada sobre ele do que de costume... para consolar seu espírito para que não viesse a desfalecer alguma vez pela veemência das dores que constantemente o atormentavam, o santíssimo pai mandava que seus companheiros cantassem muitas vezes os Louvores do Senhor. ... Fazia isso também de noite para edificar e consolar os seculares que, por sua causa, vigiavam fora do palácio. ...
E a Frei Elias que lhe chamou atenção, “disse com grande fervor de espírito: Permite-me, irmão, que, nas minhas enfermidades, eu me alegre no Senhor e nos seus louvores, pois, com a cooperação da graça do Espírito Santo, estou tão unido e ligado ao meu Senhor que, por sua misericórdia, bem posso alegrar-me no Altíssimo”(cf. EP 121,1-2.11-12). O que ele praticava, também o aconselhava a seus irmãos: “E rogo ao frade doente que dê graças por tudo ao Criador; e que deseje estar tal qual o Senhor o quer, são ou doente ... (RnB 10,3).
O agradecimento é norma de vida para os irmãos, inclusive nas adversidades: “E quando as pessoas os envergonharem e não quiserem dar-lhes esmola, deem por tudo isso graças a Deus; porque pela vergonha vão receber grande honra diante do tribunal de nosso Senhor Jesus Cristo” (RnB 9,6). “E devolvamos todos os bens ao Senhor Deus Altíssimo e sumo e reconheçamos que todos os bens são dele e demos graças por tudo a ele, de quem todos os bens procedem” (RnB 17,17).
Clara não vive com menos fervor nesta conduta que marca a vida de seu Pai. Mais do que Francisco, ela carregou o fardo de grave enfermidade. A Legenda nos atesta que “Foi sobretudo na doença que se evidenciou o alto grau de virtude que alcançou. Com efeito, durante os vinte e oito anos de doença contínua, nunca se ouviu um lamento ou um queixume. Pelo contrário, de seus lábios brotavam sempre palavras santas e ações de graças” (LSC 39).
Devota filha da Igreja, e adoradora fidelíssima do Senhor na Eucaristia não se contenta em agradecer sozinha a comunhão e a visita do Papa num mesmo dia: “Entretanto tinham saído todas as irmãs. Clara chamou-as e levantando os olhos ao céu, as mãos estendidas e banhada em lágrimas, disse para as irmãs: “Louvai ao Senhor, minhas irmãs. Cristo concedeu-me hoje tão grande benefício, que nem o Céu e a terra são suficientes para lhe agradecer. Hoje foi-me permitido receber o Senhor e ver o seu representante sobre a terra” (LSC 42).
Mas, é necessário retomar sempre de novo, o que foi tão forte para Clara, para que renovemos sempre a consciência de que: “A nossa vocação é o maior de todos os benefícios que recebemos e diariamente continuamos a receber do nosso benfeitor, o Pai das misericórdias, pelos quais devemos render infinitas graças...” (TestC 2-3).
No apagar das luzes de mais um ano, em muita gente cantou no escuro, unamos nossa voz à voz de Clara, de Francisco, de todas as criaturas que conhecem a gratidão. Com todo o universo “vamos louvar e agradecer, com humildade ao Senhor bendizer”.