A Ciranda da Inserção
no Meio dos Pobres!
Com o coração em luto e ao mesmo tempo repleto de gratidão pela vida inserida entre os mais pobres, de irmã Maria Ármine Panini, teceremos algumas considerações sobre este elemento fundamental e fundacional do nosso carisma: Inseridas no meio dos pobres.
Pelo nosso carisma somos chamadas a fazer-nos “próximas” e “próximos” lá onde o “amor não é amado”. Abaixar-se para tomar nos ombros a irmã e o irmão feridos, como nos indica Jesus em Lc10,25ss, faz sentir o coração pulsar em sintonia com as alegrias e dores do povo, que nos leva com ele a buscar caminhos de superação e transformação.
No livro do Ex 3,8 compreendemos que a vocação brota do clamor vindo do meio do povo. A compaixão anunciada e vivida por Jesus nos que sofrem por doenças, discriminações ou preconceitos, revela a ternura de Deus para com seus filhos e filhas.
Da mesma forma, o fogo do amor de Deus que arde em nós, nos move para junto aos menos amados, os seus preferidos. “O Senhor me conduziu entre os leprosos e eu tive compaixão deles”, confessa Francisco de Assis, no final de sua vida. Consumido pelo amor, ele acolheu em seu corpo e em sua alma as dores e as alegrias dos pobres. Deixou-se marcar pelos estigmas da cruz; estigmas da morte e ressurreição. Os estigmas no corpo de Francisco, atestam que “o amor deixa marcas”, no dizer de Frei Vitório Mazzuco.
Santa Clara de dentro do mosteiro tem os olhos e o coração voltados para os outros: acolhe os doentes, reza com eles e os cura; reza pela cidade em guerra e livra Assis dos invasores sarracenos; acompanha as necessidades da igreja e do mundo.
O chamado de Deus às nossas primeiras irmãs, se fez ouvir na voz dos imigrantes italianos que sofriam com a falta do ensino e da evangelização. E Frei Policarpo lhes propõe um modo de vida simples no meio do povo simples. “O estar no meio do povo simples é que vai determinar o modo específico de ser das Irmãs Catequistas Franciscanas” (Um Chamado se faz caminho. p 73 ,Irmã Ede Valandro)
Assim, segue nossa história pautada por verdadeiros testemunhos de “inseridas no meio dos pobres”. Irmã Aurélia Dal Mago¹ falando das irmãs com quem conviveu quando ingressou na congregação em Presidente Kenedy-SC, assim se expressou: “Eu entrei mais adulta, minha família era pobre mas meus país eram de muita fé, participavam sempre da comunidade, mesmo que era distante (...). Lá moravam as irmãs Ana Dematé e Iria Girardi. Elas eram irmãs de muita oração, viviam bem simples, estavam entre as pessoas mais simples e pobres.
Elas visitavam bastante as famílias e eram muito conhecidas. Depois fui para Herval do Oeste, onde morávamos numa casa bem apertada porque éramos 95 jovens, e realmente a questão da alimentação era bem reduzida. Vivia-se do trabalho, as irmãs davam aulas, plantava-se milho, feijão, legumes para nos manter”. É interessante perceber nesta fala que a inserção no meio dos pobres pode exigir de nós, estar nas condições dos pobres, sentir as mesmas necessidades, descobrir alternativas de sobrevivências. Se as jovens eram muitas, poderiam simplesmente não receber todas, porque afinal não tinham condições para tal. Mas não, as jovens vinham de famílias pobres e eram acolhidas.
Ao falar sobre sua inserção Irmã Aurélia traz um outro elemento: Estar no meio dos pobres a gente aprende muito, vejamos o que ela diz: “Sim, no meio do povo a gente sente bem de perto como eles vivem, vivem unidos na partilha. Lembro muito, na minha missão em Angola-África, quando a gente fazia os encontros de catequistas ou de casais sempre havia a partilha do pouco que cada um trazia. Era uma união, na simplicidade, na pobreza mas também na solidariedade. O próprio conhecimento que eles tinham partilhavam. Se visitavam, se cumprimentavam, sentiam a dor e o problema do outro; nos óbitos, sempre deixavam tudo para estar junto nesses momentos mais difíceis. E eu, procurei viver nessa simplicidade junto com eles, sempre me senti muitíssimo bem junto com o povo: com as mamás, com as crianças, com os vizinhos (...) e eu sentia que eles gostavam da gente. Aquelas mamás simples, mais de idade, muito doadas, fervorosas! (...) se dependesse de mim eu ainda estaria lá.”
E quem conhece Irmã Aurélia sabe que seu testemunho é verdadeiro! O estar no meio dos pobres, fazer-nos “próximas/os”, é mais do que só estar entre eles. Exige superar barreiras culturais, religiosas e sociais mas também as barreiras internas que por vezes carregamos: da acomodação, da indiferença, da superação de si mesma e fazer caminho juntos em ritmo de profecia, e sentir como Francisco, “o amargo se tornar doce”. Há que se colocar na escuta do Divino Espírito, para que o grito dos pobres nunca nos deixe indiferentes, o medo não nos paralise, e os desafios não nos desanimem.
Acreditamos que é isso que acontece com as irmãs que estão junto ao povo Guarani Kaiowás que, apesar de tanta violência e injustiça, continuam sendo presença, convivendo com eles, por dias melhores.
Ecoa ainda em nossos ouvidos o paradigmático apelo de D. Leonardo Steiner, no centenário da congregação: “ Irmãs, não deixem os pobres sozinhos”. Na vivência do nosso carisma, “Inseridas no meio dos pobres”, vem-nos a interpelação do evangelho, “... porque escondeste essas coisas aos sábios e entendidos e as revelaste aos pequeninos” (Mt 11,25).
Será que Deus não nos espera entre os pequeninos/as para revelar-nos muitos dos seus segredos? É na convivência com o povo simples que Deus nos revela a sabedoria que vem do sofrimento; é com eles que alimentamos nossa esperança, com eles e elas aprendemos a resiliência, a espera “pelos tempos e surpresas de Deus”. É entre os pequenos, seus preferidos que Ele nos aguarda e guarda “os seus tesouros”, alimento para a nossa fidelidade no seu seguimento.
1-Irmã Aurélia Dal Mago - 81 anos, dos quais viveu 20 anos na Bahia e 20 em Angola - África