“Criar nas Américas a consciência sobre a importância
da Amazônia para toda a humanidade” (DAp 475).
MEMÓRIA... Nessa época do ano quando visitando aldeias, encontramos pelos caminhos os ipês floridos e, ao contemplá-los recordamos que já foram sementes... Assim é a trajetória da caminhada humana, eclesial, social, as sementes foram lançadas porque houve semeadores/as e o tempo foi favorável. Kairós, o tempo de Deus, a gratuidade do Criador, manifestada de forma silenciosa e misteriosa faz a semente germinar, crescer, florescer e dar frutos.
Assim foi o início da presença da Igreja na Amazônia que se deu no cenário da ocupação colonial, da Espanha e Portugal. A incorporação do imenso território amazônico na sociedade colonial, com sua posterior apropriação por parte dos Estados nacionais, transcorreu num longo processo, de mais de quatro séculos. Até o início do século XX, as vozes em defesa dos povos nativos eram frágeis. Com o Concílio Vaticano II essas vozes se fortaleceram, as Conferências do Episcopado Latino-Americano, Medellin (1968), Puebla (1979), Santo Domingo (1992), Aparecida (2007) vieram consolidar as proposições conciliares e apontar para Amazônia ao reconhecer sua biodiversidade e a diversidade cultural de seus povos, a sua importância para o futuro da humanidade.
Em 2002 foi criada a Comissão Episcopal para a Amazônia (CNBB), sob a coordenação de Dom Jayme Chemello, com objetivo de articular melhor, em nível nacional, a solidariedade de todo o Brasil para com a Igreja na Amazônia. A Campanha da Fraternidade de 2007 com o lema “Vida e Missão neste chão”; a provocação que surge da V Conferência de Aparecida: “Criar nas Américas a consciência sobre a importância da Amazônia para toda a humanidade (DAp 475). Foram marcos importantes para que se efetivasse o surgimento da Rede Eclesial Pan-Amazonica (REPAM) em 9 de setembro de 2014 com as seguintes entidades fundadoras: Conselho Episcopal Latino-Americano (CELAM); Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB); Secretariado da América Latina e Caribe de Caritas (SELACC); Confederação Latino-Americana e Caribenha de Religiosos e Religiosas (CLAR).
UM NOVO JEITO DE SE ORGANIZAR...Mas afinal o que é a Pan-Amazônia... Envolve os 09 países que têm a floresta amazônica em seu território, 67% Brasil, 13% Peru, 11% Bolivia, 6% Colombia, 2% Equador, 1% Venezuela, Surinanme, Guiana e Guiana Francesa. O que define a Pan-Amazônia não é somente a questão geográfica e física, mas os povos ribeirinhos, caboclos, seringueiros,afro descentes, quilombolas, indígenas que vivem na invisibilidade, vulnerabilidade e enfrentam os mesmos problemas para sobreviverem numa das últimas reservas de floresta tropical úmida do mundo. Sofrem as ameaças dos grandes empreendimentos que visam somente interesses econômicos, mascarados de “projetos de desenvolvimento”, depredam as riquezas naturais e culturais, a biodiversidade, causando impactos socioambientais irreparáveis deixando para a população nativa somente uma problemática que se agrava com a crescente violência, prostituição infantil, doenças físicas e psicológicas, desempregos.
É nesse chão sagrado que atua a REPAM como um organismo de articulação e comunhão que tem como objetivo fortalecer a presença missionária no território amazônico ao favorecer o diálogo e unidade eclesial em defesa da vida na Amazônia. É uma REDE que se coloca a serviço dos povos da Pan-Amazonia e busca lutar em defesa de suas sabedorias ancestrais, de seus territórios e em defesa de seus direitos a uma vida digna.
A sua fundação é um marco importante na caminhada da Igreja Latino-Americana e já tem ressonâncias dessa experiência em outros países. Já existe a Rede Eclesial na Bacia do Congo na África, outra no Aquífero Guarani e há províncias eclesiásticas, como Bogotá, Colômbia que estão organizando a pastoral de conjunto em torno da água.
A REDE é leve e oferece a sustentação para que as pastorais desenvolvam suas ações de uma forma efetiva, portanto, torna-se essencial em tempos de travessia em que há dispersão e sempre surge a tentação de desviar-se do foco. Foi isso que ocorreu com as pastorais sociais na Diocese de Marabá que procuraram se fortalecer com a parceria da REPAM, através de encontros formativos e assessorias em atividades que refletem sobre a situação da Amazônia e o empoderamento dos povos amazônicos.
A REPAM busca intensificar e fortalecer iniciativas de sustentabilidade a partir dos saberes e experiências dos povos amazônicos possibilitando o intercâmbio de saberes e ações que caracterizam o trabalho em REDE, o qual vai se consolidando através de vivências e experiências de muitas pessoas em suas dioceses, comunidades, paróquias, organizações.
A REPAM vem contribuindo na dinamização do Sínodo Especial para Amazônia com o tema: “Amazônia – Novos caminhos para a Igreja e para um ecologia integral”. O Sínodo acontecerá de 06 a 27 de outubro em Roma. Para isso foi elaborado documento preparatório cuja finalidade era a escuta dos povos amazônicos, de modo especial dos povos indígenas. A partir dos dados recolhidos dessa ampla pesquisa foi possível a elaboração do Instrumentum Laboris que quer desencadear um processo de conversão ecológica e pastoral para deixar-se interpelar pelas “periferias geográficas e existenciais” (EG, n.20), portanto há um longo caminho a ser percorrido. Tal processo deve continuar durante e depois do Sínodo, como elemento central da vida futura da Igreja. “A Amazônia clama por uma resposta concreta e reconciliadora”. (IL 3)
IGREJA COM ROSTO AMAZÔNICO - A Amazônia é a segunda área mais vulnerável do planeta, depois do Ártico, mesmo assim, apesar da sua vulnerabilidade torna-se alvo das grandes corporações econômicas, tanto nacional quanto internacional (agronegócio, mineração, pecuária). São verdadeiros depredadores que em suas ações criminosas legitimadas por uma política de flexibilização das leis ambientais que permitem o avanço dos desmatamentos, o qual nesse período de seca tende a se agravar provocando grandes incêndios em vastas áreas dos estados da Amazônia Legal (9 estados brasileiros) e Bolívia. A prolongada intervenção humana depredatória “está levando a Amazônia rumo a um ponto de não retorno”. (IL 16)
Com todo esse quadro caótico e desolador, é tempo de Kairós, tempo de renovar o ardor missionário e sonhar uma “Igreja que tem a oportunidade história de se diferenciar claramente das novas potências colonizadoras, ouvindo os povos amazônicos para poder exercer com transparência sua missão profética. A crise socioambiental abre novas oportunidades para apresentar Cristo em toda sua potencialidade libertadora e humanizadora”. (IL 7)
Tendo como fonte inspiradora a Laudato Si – Ecologia Integral - e as palavras proféticas de Papa Francisco: “A Igreja está na Amazônia, não como aqueles que têm as malas na mão, para partir depois de terem explorado tudo o que puderam. Desde o início a Igreja está presente na Amazônia com missionários, congregações religiosas, sacerdotes, leigos e bispos e lá continua presente e determinante no futuro daquela área”. Aqui queremos plantar e deitar as raízes do “nosso modo francisclariano de viver” (LI1) com alegria, simplicidade, comprometidas com a vida dos povos amazônicos ameaçados em seus direitos fundamentais. Ao procurar SEMEAR a esperança profética que aponta novos caminhos de sustentabilidade e criar espaço para o sonho do Bem Viver, coloca-se em movimento coração, pés e mãos.
Semeadoras da justiça e da paz, solidárias na dor, somos mulheres que inspiram outras mulheres a plasmar com o próprio SER a Igreja com rosto amazônico.
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