Nesse mês vocacional trazemos aqui o testemunho vocacional de irmã Zélia Maria Batista, que no momento atua junto ao povo Guarani-Kaiowa. Ela procura fazer uma relação com Clara de Assis, cuja solenidade, celebramos no mês de agosto. Que esse testemunho nos ajude responder ao nosso chamado.
“O Filho de Deus fez-se para nós o caminho”. TestC 5
Quando Clara faz essa afirmação, fico a imaginar como foi essa trajetória, quantas portas ela teve que abrir para lançar-se ao desconhecido de uma forma livre e ousada, rompendo com o mundo da nobreza, deixando para traz as seguranças, para simplesmente colocar-se à caminho. Tudo porque, Ele, o seu Amado se fez Caminho, através dos mais pequeninos. Os pobres, os pequenos são os sinais luminosos na noite escura e em meio ao caos, para as Claras de ontem e de hoje, pois sempre nos confirmam na missão. Adentramos por esse caminho que não tem volta, é real, concreto, pois os pobres nos comunicam o amor de Deus, a sua gratuidade e generosidade.
Estar a serviço dos pobres me faz uma mulher consagrada feliz. Descortina-se um caminho de possibilidades, de processos de conversão em todas as dimensões da vida humana, as portas vão se abrindo a cada novo passo.
Conviver com os povos indígenas e ter a possibilidade de nutrir-se de suas espiritualidades é resgatar a essência original perdida pelos excessos de uma sociedade consumista, individualista, capitalista que obscurece as buscas e desejos mais profundos de viver o chamado, a vocação a serviço da vida.
Nutrir-se das espiritualidades dos povos indígenas é fazer o caminho de volta à Assis, à intuição primeira, ao primeiro amor. É de novo experimentar que só o Cristo pobre e crucificado pode nutrir e saciar as sedes humanas; vencer a aridez da falta de esperança e sonhos; romper com a bolha da indiferença e das falsas seguranças, que muitas vezes nos impedem de dar passos mais ousados e avançar pelo “caminho da bem-aventurança”. 2 In,13.
Não pode existir no coração humano outras mediações a não ser a busca do absoluto. Vivenciar concretamente a umbilical dependência de Deus, “O Pai de toda misericórdia” TestC 2, que nos agraciou com o dom da vocação. Despojada e livre, caminho em busca do tesouro mais precioso; do encontro e do abraço que selam uma aliança consolidada na cruz e no sangue derramado de tantos inocentes, crucificados de ontem e de hoje: “abraço o cristo pobre como uma virgem pobre” cf. 2 In, 18.
Pelo caminho de sombras e luzes sou surpreendida e acolho afetuosamente em meu corpo, o calor do abraço de Márcio Moreira, uma das mais importantes lideranças Guarani-Kaiowa assassinada após a nossa visita; a frieza de corpos dilacerados e transfigurados, posso tocar e sentir a dor, a alegria, a doçura, a luta e o luto, a vida teimosamente resistindo e deixando o perfume da gratidão.
Como Maria Madalena, envolvida pelo canto e dança das crianças Guarani Kaiowa, que sempre nos acolhem na Retomada Guapoy, posso afirmar “Eu vi o Senhor” (Jo 20,18). Somos testemunhas de que Cristo vive e haveremos de dançar e cantar a vitória da VIDA, que irrompe majestosa em cada novo amanhecer, pois o “Filho de Deus se fez para nós o Caminho”.