Os sofrimentos e a morte de Jesus, submergiram os discípulos num mar de decepção e tristeza. Simplesmente não conseguiam entender o que havia acontecido: “Esperávamos que fosse Ele que libertaria Israel... mas, já passaram três dias desde que tudo isto aconteceu” (Lc 24). A tristeza e a decepção tolheram seus passos, emudeceram sua voz lhes tiraram o ânimo de seguir anunciando o Reino, como lhes havia ordenado Jesus. Todo desejo do novo foi sufocado pela decepção. E a maneira de superar o sofrimento foi voltar ao que sempre foi: “- Eu vou pescar” – “Nós também vamos contigo”. Fazer acontecer o “novo” exige ousadia, ânimo, exige esperança. Eles estavam experimentando o contrário: a esperança estava morta, a ousadia se encolheu atrás do medo, o ânimo que restava só dava para voltar à velha rotina: pescar conforme estavam acostumados. Trabalho de uma noite infrutífero.
Mas à luz do dia, o Ressuscitado desafia: “lancem as redes do outro lado e encontrarão” (Jo 21, 6). O desafio do Ressuscitado é a mudança, é dar à luz o novo, à nova maneira de ser e trabalhar, de se relacionar, de viver.
Em Clara de Assis, temos um exemplo vivo do alternativo gerador do novo: “...Chegado o Domingo, Clara, sobressaindo pelo aspecto festivo, dirigiu-se com os demais para a igreja. Ali, algo de muito significativo aconteceu. Na altura da distribuição dos ramos, Clara ficou modestamente retraída, no seu lugar. Foi o próprio Bispo que, descendo os degraus, lhe fez a entrega pessoal do ramo.
Na noite seguinte, obedecendo às ordens do santo, empreendeu a saída tão desejada em companhia de pessoas de sua confiança. Não lhe parecendo prudente usar a saída do costume, optou por outra, abrindo com as próprias mãos e com uma força de que ela mesma se admirava, uma porta que há muito tempo estava obstruída com madeira e pedras” (LSC 7).
Para Francisco, o “outro lado” começa na sua vida pessoal, mudando a compreensão de reconstruir a Igreja: passou da reconstrução do edifício de pedras, à reconstrução da Igreja-pessoas-excluídas do convívio, mudando o nojo e o atirar esmolas em serviço que devolve a dignidade: “Depois disso, amante santo de toda humildade, transferiu-se para um leprosário. Vivia com os leprosos, servindo com a maior diligência a todos por amor de Deus. Lavava-lhes qualquer podridão dos corpos e limpava até o pus de suas chagas, como disse no Testamento: ‘Como estivesse ainda em pecado, parecia-me deveras insuportável olhar para leprosos, mas o Senhor me conduziu para o meio deles e eu tive misericórdia com eles’. Essa visão lhe era tão insuportável que, em suas próprias palavras, no tempo de sua vida mundana, tapava o nariz só de ver suas cabanas a duas milhas de distância.
Mas, eis que um dia, quando, por graça e força do Altíssimo, ainda vivia como secular mas já tinha começado a pensar nas coisas santas e úteis, encontrou-se com um leproso e, superando-se, chegou e o beijou. A partir de então, foi ficando cada dia mais humilde até chegar à perfeita vitória sobre si mesmo, por misericórdia do Redentor (1Cel 17,1-5).
E sem pretender fazê-lo, colocou o dedo na ferida de uma igreja afastada do evangelho, porque afastada dos pobres e “lançou a rede da Igreja para o outro lado: o lado dos pobres mais pobres”, dos “decretados mortos”. Sem nada pretender inaugurou uma nova maneira de seguir Jesus Cristo, ajudou a igreja a retornar ao Evangelho.
Que nos deixemos iluminar pelo testemunho de Clara e Francisco. Que não nos paralisem os obstáculos, as portas e caminhos fechados. Que tenhamos a ousadia de jogar nossas redes para outros lados. “Dá-nos ousadia, Divina Ruah, dá-nos teimosia, Divina Ruah, conduz nossos passos...” (Irmã Dalvina Maria Pedrini).
Comentários
Faço-o com carinho. Para mim também é um momento de reflexão, de revisão, de encontro.
Obrigada pelo incentivo.
Abraço com carinho
Obrigada Maria por nos proporcionar esse momento.
Rita